Meus pais chegaram em Brasília, vindos de Campina Grande, na Paraíba, em julho de 1962, depois de sete longos dias de viagem. No início, morávamos no acampamento da Rádio Nacional, no meio do cerrado. Da minha infäncia nesse lugar guardo uma lembrança insólita e tenebrosa. Uns amigos do meu pai, evangélicos, me convidaram para um culto. Lembro bem dos testemunhos, sob a tenda que parecia um enorme circo. Um homem, não sei se pastor ou apenas um fiel da igreja, começou a dizer, aos berros, que Satanás estava solto e procurando almas. Na minha cadeira e insignificância, tive a impressão de que ele gritava para mim: Cuidado, irmão, Satanás está esperando para te pegar. Nao sei se as palavras eram exatamente essas, mas era isso o que eu entendia e o que eu me lembro de ter ouvido. Para piorar o meu pavor, o cara começou a dizer que tinha visto uma mulher, descrente, ser toda mordida por um espírito invisível que era o próprio Satanás. Nao esqueço o desempenho cênico desse homem, como náo esqueço o terror que me concedeu. Naquela noite, e noutras noites seguintes, eu nao consegui
dormir direito, mas para atenuar meu pesadelo lembro de uma canção que vinha da televisão, e que me trazia um pouco de calma.
F Comme Femme (Adamo)
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quinta-feira, 29 de abril de 2010
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