Eu sempre fui um bicho muito esquisito, reconheço. Nasci velho e agora sinto que rejuvenesço, ou me engano? Será que sou o verdadeiro Benjamin Button? Muito além da referência cinematográfica, o que quero dizer é que, lá pelos tempos pré-históricos de minha adolescência, nunca curti essa onda de acampamento. Quando saiu o álbum da Legião, “Música para acampamento” eu refleti que, na vera, na vera, eu nunca fui de gostar da história de pegar uma barraca, juntar uns badulaques e ir pra beira de um poço azul, ficar cheio de mumunhas e corumbar a tarde toda. Nem pensar. Conto nos dedos da mão do Lula o número de vezes que encarei essa história de ir pro mato, beber umas, fumar outras e procurar disco voador entre uns pegas e outros. Minha turma vivia por Pirenópolis, Goiás Velho, Alto Paraíso, nômades felizes sorrindo para o tempo, e eu sempre preferi me agarrar a um bom livro, viajar em um bolachão duplo do Gênesis...ah, The Lamb lies down on Broadway ou delirar com Yes, Emerson, Lake & Palmer, putz, quase furei o Close to the edge e o Tarkus. Que cachoeira, que nada. Era um velho, eu sei, sou uma múmia. Mas uma vez cedi ao convite do Urias e fomos, com meu irmão, acampar em Alexânia, num clube campestre chamado pomposamente Country Club Nova Florida. Alguém conhece? Devia correr o ano da graça de 76, talvez 77, e o lugar era bem bacana, com uma estrutura legal. Levei o violão, of course my horse, e uma matula de sandubas e refris e algumas poucas cervejas. Explico: o Urias não bebia uma gota sequer de álcool. Tem coisa pior que você beber sozinho? O lugar estava meio entregue aos vagalumes e mariposas e havia muita paz. Além da nossa barraca, pintou outra no fim da tarde. Um casal gay maduro curtia a beleza da vida conjugal no campo. Talvez me perguntem por que tenho certeza que era um casal gay? Se não fosse, meu amigo, era uma amizade que matava a sede na saliva, como dizia o Cazuza. Entenda. À noite, empunhei meu amigo violão e tome canções e canções. Sò eu bebendo cerveja e esfolando os dedos em meu repertório ainda pequeno, mas já satisfatório para uma baladinha. Os dois nature boys se achegaram timidamente, se apresentaram, e começaram a cantar conosco. Lá pelas tantas, um deles disse ter visto uma estrela cadente e o outro me pediu para tocar sua canção predileta: “Não identificado”. Notei que o Urias estava meio constrangido com a presença dos dois nubentes espargindo testosterona, mas, como bom mineiro do Prata, ficou na dele, tomando seu guaraná, deixando o dia desviver lentamente. A cerveja me deixou sonolento e eu acho que também comecei a ver estrelas despencando sobre o Nova Flórida. Era hora de dormir. Tempos depois, ainda com o Urias, mas agora com a presença do Banana e do Cleber, fomos acampar em Pirenópolis, na época das Cavalhadas. Se há algo parecido com a fauna de Woodstock-69 só pode ser Pirinópolis-81. As barracas, como uma espécie de mata ciliar de material inorgânico, margeiam o pequeno rio que corta a cidade. Cabeludos, laricas, esculturas em epoxi, máscaras, violões. Acordei de ressaca e tive dificuldade para abrir a barraca, pois um maluco simplesmente capotara na porta, sobre o zíper. À noite, o perfume de Marias Joanas deixava o ar como o de um enorme templo a céu aberto, cheio de incenso. Inspirado nessa aventura escrevi uma canção que dizia:
Houve um tempo em que as estrelas apagaram a luz
Nos banhávamos em cachoeiras, todos nus.
Índios de uma tribo enfeitaçada
no silêncio de uma madrugada
sob o sarcasmo de Deus...
Cantei-a para a galera, que nao deu muita bola e nem sei se estava mesmo lá.
Na paz!
Não identificado (Gal Costa)
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http://www.youtube.com/watch?v=dMDc9gWaUiw
terça-feira, 18 de maio de 2010
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Compartilho com o autor o meu pouco entusiasmo pelas incursões na natureza. Nunca quis ser escoteiro,lobinho e além do mais sou uma mala sem alça quando o assunto é acampamento. Se houver um único espinho é nele que eu ponho o pé.
ResponderExcluirCompartilho com o autor o meu pouco entusiasmo pelas incursões na natureza. Nunca quis ser escoteiro,lobinho e além do mais sou uma mala sem alça quando o assunto é acampamento. Se houver um único espinho é nele que eu ponho o pé.
ResponderExcluirCompartilho com o autor o meu pouco entusiasmo pelas incursões na natureza. Nunca quis ser escoteiro,lobinho e além do mais sou uma mala sem alça quando o assunto é acampamento. Se houver um único espinho é nele que eu ponho o pé.
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